segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Pessoas-objeto

"Se os consumidores desejassem realmente a posse material dos bens, se o prazer estivesse nela contido, a tendência seria a acumulação de objetos, e não o descarte rápido das mercadorias e a busca por algo novo que possa despertar os mesmo mecanismos associativos. O desejo dos consumidores é experimentar na vida real os prazeres vivenciados na imaginação, e cada novo produto é percebido como oferecendo uma possibilidade de realizar essa ambição. Mas, como sabemos que a realidade fica sempre aquém da imaginação, cada compra nos leva a uma nova desilusão, o que explica nossa determinação de sempre achar novos produtos que sirvam como objetos de desejo a serem repostos." (Sociedade de Consumo, Livia Barbosa)

Sei que parece desinteressante, mas isso fez tanto sentido pra mim porque se encaixa não só com a descrição do consumo de produtos, mas também com a descrição dos tipos de relacionamento atuais. A gente não vive mais um relacionamento, a gente consome ele.
As pessoas simplesmente se descartam como descartam um celular obsoleto, como jogam fora uma roupa velha, e se substituem como tal. E na substituição buscam sentir o mesmo prazer que sentiam no relacionamento anterior. Querem de novo a ansiedade e as borboletas no estômago, querem aquele sentimento de novo, porque o começo do amor é sempre excelente.
E as pessoas sonham com relacionamentos perfeitos. O que nunca dá certo porque a perfeição varia de pessoa pra pessoa: o que uma julga estar bom, a outra já julga ser insuficiente, e vice-versa.
E enquanto sonham e desejam, as pessoas começam a construir um relacionamento esperando que ele tenha capacidade de realizar essas suas ambições de perfeição. Mas nunca realiza, porque tudo que envolve seres humanos se torna algo profundamente relativo e instável. Sempre há choque de interesses, sempre há choque de perfeições, e ninguém consegue se fazer perfeito pra ninguém, caso contrário desmancharia a essência de seu próprio ser e assim o relacionamento acabaria por se basear em uma mentira.
A perfeição estando fora do alcance se torna uma desilusão. A expectativa de que daquela vez daria certo se torna provedora de uma decepção que tem o mesmo tamanho da perfeição que se sonhava anteriormente.
E aí com a desilusão, voltamos a buscar outras pessoas que a nossos olhos são objetos de desejo com grande possibilidade de fazerem jus à perfeição com que sonhamos desde o início. Voltamos a querer repor o amor que perdemos. Voltamos a buscar a perfeição inalcançável, amparados na esperança de que ela exista, bastando encontrar uma pessoa nova que nos desperte de novo sentimentos de começo.
Dessa forma vamos juntando sentimentos descartados, que são as decepções. Elas vão sendo acumuladas em um estoque enorme de bagunça, e vamos apertando a bagunça atrás da porta e amenizando a dor com novas esperanças. Esperanças que depositamos na crença de que a pessoa nova será capaz de realizar nossos sonhos perfeitos. Mas eu devo arriscar dizer que a perfeição não existe como nós a imaginamos, o que pode até soar triste.
Talvez se parássemos de procurar pessoas-objeto de desejo, se parássemos de sonhar com relacionamentos hedonistas, se parássemos de consumir os relacionamentos e começássemos a vivê-los, talvez aí alguma coisa verdadeira pudesse acontecer. Verdadeira, não perfeita.
O problema todo é acharmos que as pessoas tem que ser como os produtos, que elas estão aí para satisfazer nossos sonhos. Transferimos a lógica da sociedade de consumo para ilógica dos relacionamentos, e não dá certo tentar colocar uma coisa fria perto de uma coisa quente. 

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